Recreio, MG: A divisão de Conceição da Boa Vista

É voz corrente que o desenvolvimento do distrito de Conceição da Boa Vista começou a declinar a partir do impasse com um fazendeiro que não queria a ferrovia cortando suas terras. Com a distância no tempo, sempre correremos o risco de uma leitura anacrônica dos fatos que então se passaram. Com esta ressalva, permitimo-nos suspeitar que não teria sido um único proprietário de terras a desencadear a revisão do traçado da ferrovia. Talvez tenha havido interferência de várias pessoas. Quem poderia nos afirmar que aquele proprietário não assumiu tal postura depois de ser convencido por seus vizinhos e amigos, com argumentos que foram perdidos no tempo? Acreditamos ser prudente não tomar como verdade absoluta as informações em torno daquele fazendeiro que passou à história como uma espécie de anti-herói, ou seja, como símbolo do atraso em que o distrito se viu mergulhado nos anos seguintes.
tivemos oportunidade de mencionar a dificuldade da abertura da estrada até Santa Isabel, hoje Abaíba. O terreno devia ser realmente difícil para as tecnologias da época, ou não teria recebido este nome uma das primeiras fazendas do lugar. Segundo Joaquim Ribeiro Costa, em Toponímia de Minas Gerais, “abaíba” seria uma palavra da língua tupi para referir-se a difícil, trabalhoso ou íngreme. E se observamos uma carta topográfica, perceberemos que os tributários São Vicente e Duas Pontes, que vão alcançar o ribeirão dos Monos um pouco acima de Conceição da Boa Vista, atravessam um terreno mais acidentado do que o entorno do percurso escolhido para a estrada de ferro.
Onde nos afiançarmos para analisar a atitude daqueles que desencadearam a revisão do trajeto da ferrovia? No momento queremos apenas observar que o ano de 1876 representou uma tomada de decisão importante: a partir daí, o escoamento da produção agrícola seria através da estação Santa Isabel ou Recreio. Portanto, muitas providências foram certamente tomadas com o objetivo de permitir o deslocamento até a estação. Quem pode nos garantir que os fazendeiros não tenham decidido em conjunto, talvez porque fosse difícil abrir novos caminhos carroçáveis de forma a que todas as propriedades chegassem com facilidade ao ponto de embarque em Conceição da Boa Vista?
Queremos ressaltar que a divisão de Conceição da Boa Vista se insere entre as conseqüências da abertura da Estrada de Ferro da Leopoldina, devendo ser analisada também sob o aspecto de outras possíveis forças que a determinaram. O surgimento dos distritos de Providência (maio 1890), Recreio (junho 1890), Santa Isabel e São Joaquim (novembro 1890) nos remetem a todo um movimento político que se desenvolvia há, pelo menos, uma década. Não foram estes os únicos distritos criados em Minas no seguimento de importantes mudanças, quais sejam a abolição gradual da escravatura oficializada em 1888 e a mudança no sistema de governo no ano seguinte.

Recreio, MG: O Comércio de Recreio em Publicações Esparsas

Na edição especial da Revista Acaiaca de Leopoldina, de março de 1954, encontram-se anúncios comerciais daquela cidade e de municípios vizinhos. Comemorava-se o 1º Centenário da elevação do Feijão Cru à categoria de Vila e Cidade da Leopoldina. Em estilo simples e direto, encontramos na segunda página da revista dois anúncios de comerciantes de Recreio.

HUMBERTO TOMASCO

Máquinas de beneficiar arroz

Exportação de arroz por atacado

RUA ESTEFÂNIO, 73 – FONE, 23 – RECREIO - MINAS

JOSÉ DE CASTRO LACERDA

Atacadista de BebidasDepositário de CimentoCal

- Querozene e SalDistribuidor de Cerveja Brahma

RUA GOVERNADOR VALADARES – RECREIO - MINAS

Anúncios pequenos e simples, em quadros de 10,5 cm de largura por 2 cm de altura. A folha seguinte, ao contrário, era ocupada inteiramente pela seguinte mensagem:


INDUSTRIAL ESTEFÂNIO DOS SANTOS LDTA.

FUNDADOR - ESTEFÂNIO DOS SANTOS

JOSÉ DOS SANTOS

JOÃO DOS SANTOS

FRANCISCO DOS SANTOS e

D. INÁCIA ROSSIGNOLI DOS SANTOS

Levam os seus cumprimentos ao progressista povo e administradores de LEOPOLDINA, por motivo das festividades do CENTENÁRIO da cidade.

Fabricação de Manilhas e seus

Pertences

RUA SÃO JOAQUIM, 135

RECREIOMINAS GERAIS


Parece-nos que estes anunciantes seriam os mesmos que apoiavam o periódico de Recreio, onde também foi publicado o texto de Mauro de Almeida Pereira que se encontra na página 42 da edição da Acaiaca a que estamos nos referindo. Trata-se de uma versão extremamente reduzida da história do surgimento da cidade, conforme a tradição oral que circulava naquela época.

Recreio, MG: A Imprensa

Assim com os núcleos urbanos mais próximos, Recreio passou a contar com um órgão de imprensa nos últimos anos do século XIX. Embora saibamos que muitos daqueles periódicos não sobreviveram ao segundo número, realizamos um levantamento através de indicações contidas em Efemérides Mineiras, de José Pedro Xavier da Veiga, para conhecer os títulos que circularam na região. Em ordem de data da primeira edição temos o seguinte quadro.
1877-O Operário-(Além Paraíba);
1879-O Leopoldinense-(Leopoldina);
1881-Correio de São José e O Além Paraíba-(Além Paraíba);
1884-A Folha de Minas e Gazeta de Cataguases-(Cataguases);
1885-O Povo*-(Campo Limpo); O Bilontra-(Cataguases); Princípio da Vida-(Leopoldina);
1886-José Bonifácio, O Cataguasense e O Povo*-(Cataguases); O Pássaro-(Leopoldina);
1887-Estrela de Minas e Idéia Nova-(Leopoldina); O Muriaé-(Muriaé);
1888-Irradiação-(Leopoldina); Gazeta Popular-(Miraí); O Alto Muriaé-(Muriaé);
1890-Gazeta do Leste-(Leopoldina); Tapiruçuano-(Palma); A Voz Mineira-(RECREIO);
1892-A Leopoldina-(Leopoldina); O Município-(Miraí); Eco Municipal-(Muriaé); Correio de Palma-(Palma);
1893-O Progresso-(Miraí);
1894-Eco de Cataguases-(Cataguases);
1894-A Falena-(Leopoldina); Gazeta de Palma-(Palma); Voz de Tebas-(Tebas);
1895-Correio da Leopoldina, Gazeta da Leopoldina e Mediador-(Leopoldina);
1897-Cidade da Palma-(Palma); Tiradentes-(Vista Alegre).
* os dois periódicos denominados O Povo são, na verdade, a mesma publicação. Seu fundador, Estevam de Oliveira, transferiu-o para Cataguases após um ano de circulação em Campo Limpo. O jornal combatia a escravidão e a monarquia, constituindo-se em órgão do Partido Republicano.
Não encontramos a data em que começou a circular O VERBO, jornal mais longevo de Recreio. O mais antigo número de que se tem referência é de 1906, conforme se constata no acervo da Hemeroteca Pública de Minas, em Belo Horizonte. E conforme pode ser observado na fotografia abaixo, em 1946 o periódico estava presente nos momentos mais importantes da vida da cidade.


Esta fotografia é de 1946, por ocasião de reivindicação de reajuste salarial dos ferroviários, na frente da Sede do jornal O Verbo.

Recreio, MG: Club da Lavoura

As associações assim denominadas reuniam os lavradores dos distritos com o objetivo de promover a agricultura e o comércio, seguindo orientações do Club Central da Lavoura e Commercio do Rio de Janeiro. Tratava-se, portanto, de um órgão regulador das atividades de produção e escoamento, exercendo um certo poder de pressão sobre o poder público. Foram os Clubes da Lavoura que organizaram, por exemplo, o processo de substituição da mão-de-obra escrava pelo braço imigrante. Como exemplo, remetemos o leitor ao endereço http://www.cantoni.pro.br/documentos/indexdocs.html onde pode ser lida uma das atas da associação de Angustura.

No ano de 1884 o Club da Lavoura de Conceição da Boa Vista era presidido pelo Barão de Avelar Rezende, tendo como secretário o Padre Modesto Theophilo Alves Ribeiro e sendo membros da Comissão Permanente os fazendeiros Manoel Barbosa da Fonseca, Francisco Ferreira (Brito) Netto, Manoel Lobato Galvão de São Martinho, Doutor Lucas Matheus Monteiro de Castro, João Evangelista Teixeira de Barros e Valeriano Coelho dos Santos Monteiro.

Em geral um Club da Lavoura distrital nomeava um procurador para representá-lo nas reuniãos do Club Central. Neste cargo surge, então, um outro nome que faz parte da história do distrito: Domingos de Andrade Filgueira representou Conceição da Boa Vista no ano de 1884. Morador da Corte, acreditamos que enviava suas comunicações através da Mala Postal da Estrada de Ferro da Leopoldina.

Leia também: Aspectos Históricos de Recreio, MG: Itapiruçu deixa de ser distrito de Leopoldina

Recreio, MG: Associações de Moradores

A urbanização do Arraial Novo aconteceu sob o influxo do poder imperial, quando não havia ainda a separação entre Estado e Igreja. Desta forma, as associações de moradores registravam seus estatutos e atas em livros paroquiais a este fim destinados. Além deles, os livros dos Cartório de Notas esclarecem um pouco sobre as atividades destes grupos de moradores que se encarregavam dos procedimentos necessários ao franco desenrolar da vida civil.

No post anterior citamos a Comissão encarregada pela construção do Cemitério Público em Conceição da Boa Vista. Faltou informar que seus membros faziam parte da Irmandade do Santíssimo Sacramento de Conceição da Boa Vista, cujo procurador de 1884 era o paroquiano Antônio Caetano de Almeida. Naquele ano, a Irmandade tinha a receber o aporte financeiro de 3 contos 953 mil réis, legado testamentário do capitão Jacintho Manoel Monteiro de Castro para a Igreja e o Cemitério da Paróquia da Conceição da Boa Vista. Para atuar como interveniente credor no inventário, a Irmandade nomeou o advogado Theophilo Domingos Alves Ribeiro, conforme procuração datada de 23 de julho de 1884, registrada no livro do Cartório de Notas de Conceição da Boa Vista.

Lembramos que as Irmandades surgiram na Idade Média, na Europa. Compostas por leigos, além da difusão religiosa encarregavam-se também da assitência econômica de seus integrantes e tomavam as providências necessárias por ocasião da morte. Vale dizer: missa de corpo presente, acompanhamento do enterro, sepultamento em local digno e demais rituais. Segundo o Dicionário do Brasil Colonial, organizado por Ronaldo Vainfas, em Minas “as irmandades revelaram-se de especial importância para dinamizar a vida religiosa”, especialmente por conta da “precária implantação da rede de paróquias” e porque não foram autorizadas as ordens regulares. Sugerimos aos interessados, além da obra citada, artigo As Irmandades Religiosas, de Cristiano Catarin, no site Historianet http://www.historianet.com.br

Recreio, MG: Memória da Cidade na Internet

Em outubro de 2006 participamos de um Seminário, em Barbacena, no qual conhecemos pessoas que desenvolvem um projeto de preservação e valorização da história de vida dos moradores de São João del Rei. Naquela oportunidade soubemos que o objetivo é sensibilizar a comunidade para o resgate histórico, valorizando o passado através das histórias individuais. À semelhança do Museu da Pessoa, (http://www.museudapessoa.com.br/), e com o apoio da Universidade Federal de São João del Rei, entrevistas foram gravadas e posteriormente transcritas como forma de trazer, das experiências e vivências das pessoas, aspectos da memória do grupo social onde elas se inserem.

Temos também notícia sobre evento de natureza semelhante. Alunos do Ensino Médio entrevistaram diversos moradores de uma pequena localidade do interior do Paraná e organizaram um painel com as partes mais expressivas dos depoimentos colhidos. O objetivo é sempre o mesmo: conhecer as versões sobre o passado de grupos que ficam à margem da história oficial. Essas memórias não eram, até aqui, registradas em algum suporte passível de ser consultado por outras pessoas. Assim, são guardadas no interior das famílias que ainda praticam o belo hábito de narrar suas histórias de vida.

As mudanças na rotina diária não permitem que os avós conversem amiúde com os netos, nem tampouco que os pais e mães dediquem algum tempo a contar suas histórias para os próprios filhos. Quanto atingem a idade adulta, muitos se ressentem de nada saberem sobre suas famílias. Alguns passam, então, a dedicar todo o tempo livre no resgate possível. Uma dessas pessoas mandou mensagem perguntando sobre um antigo morador de Recreio.

O visitante pergunta por memórias da cidade de Recreio disponíveis para pesquisa à distância. Está interessado na trajetória de Serafim Teixeira da Luz, provavelmente o mesmo personagem citado no post de 21 de janeiro de 2007 como um dos negociantes a quem foi aforado um terreno da Fazenda das Laranjeiras, em 1885. Seria, segundo apurou em documentos do início do século XX, o mesmo Serafim Coimbra citado como proprietário do Hotel Recreio no post de 20 de março.

A este visitante, assim como a todos que nos pedem notícias de Recreio no século XX, indicamos o site http://www.usinadeletras.com.br para leitura dos ótimos textos de Pedro Wilson Carrano de Albuquerque. Enquanto isso, continuaremos a trazer para cá os poucos informes que temos tido oportunidade de encontrar.


Veja outros comentários sobre Serafim Teixeira da Luz:
Recreio, MG: Outro Negociante

Antigos Hotéis de Recreio, MG

Serafim Teixeira da Luz

Recreio, MG: Cemitério Público

Sabemos que em tempos remotos os sepultamentos das pessoas de maior poder aquisitivo eram realizados dentro da Igreja. Quanto aos menos aquinhoados, seus túmulos se localizavam no exterior, geralmente em área contígua ao templo. Na segunda metade do século XIX, porém, a preocupação com a saúde pública fez com que fossem proibidos os enterramentos dentro das igrejas.

No período que estamos estudando, com vistas a recuperar informes sobre o nascimento do distrito e depois município de Recreio, a Paróquia de Conceição da Boa Vista encontrava-se às voltas com a construção de seu cemitério, de forma a cumprir a determinação que proibia sepultamentos em seu interior. A comissão encarregada das obras era composta pelo Padre Modesto Theophilo Alves Ribeiro e pelos paroquianos Francisco Ferreira (Brito) Neto e Antônio Cardoso de Almeida. A Diretoria de Fazenda da Província de Minas Gerais, em conformidade com a Lei nº 2892 de 6 de novembro de 1882, contribuiu com 1 conto de réis em benefício das obras do Cemitério Público. Para receber esta quantia, a comissão nomeou, no dia 27 de julho de 1883, um procurador: Antonio de Santa Cecília.

Resta-nos uma lacuna importante sobre este assunto: quando foi construído o cemitério do distrito de Recreio? Sabemos que alguns moradores do então Arraial Novo, falecidos na década de 1880, foram levados a sepultamento em Conceição da Boa Vista. Sabemos também que a secularização dos cemitérios só foi estabelecida através do Decreto nº 789 de 27 de setembro de 1890. Portanto, no momento em que se iniciava a urbanização de Recreio, o serviço estava a cargo da Igreja de Nossa Senhora da Conceição da Boa Vista.

Infelizmente ainda não encontramos documentos sobre a doação do terreno onde foi erguida a Capela do Menino Deus, filial erguida em terrenos dos Ferreira Brito nas proximidades da estação ferroviária. Pode ser que a história desta Capela esclareça também os fatos sobre a abertura do cemitério. Naquela época a freguesia estava subordinada ao Bispado do Rio de Janeiro, tendo sido transferida para Mariana apenas em 1897. Não sabemos onde se encontram os registros dos atos realizados até então.

Recreio, MG: Imaginar o Passado


Atualmente os meios de comunicação permitem encontrar, rapidamente, as informações que nos interessam. E no burburinho cotidiano vamos observando que as novas tecnologias começam a abrir espaço para um novo olhar sobre o passado, não se restringindo a outros usos que delas fazem este ou aquele público. Referimo-nos, especificamente, a mensagens de jovens leitores deste blog que trazem o testemunho de estupefação diante do que aqui tem sido escrito. A surpresa que manifestam está vinculada, no mais das vezes, a uma visão estereotipada do que tenha sido a região onde seus antepassados viveram. E nos perguntam se vamos publicar um livro para recontar a história.

Não existe, a priori, a idéia de publicar um livro. Até porque, se olharmos o livro como suporte de textos, podemos dizer que este blog também o é. Muda apenas a maneira de fazer chegar a informação ao leitor. Mas o que nos leva a descartar a idéia do livro, em papel, é a intenção de submeter nossas observações aos leitores e poder reescrevê-las sempre que necessário. O livro impresso limitaria este objetivo a uma data de fechamento. O que nos parece mais adequado, no momento, é continuar postando comentários e esporadicamente montar um texto índice dos temas tratados, ampliando as funcionalidades que o blog oferece.

Outro aspecto que afasta a idéia de um livro de história é pensar nele como um conjunto coerente de textos sobre determinado assunto. A nosso ver, seria outra limitação. Afinal, acreditamos que história e memória são formas narrativas que trazem o fato acontecido para o presente, permitindo que o leitor reelabore o acontecido através de sua própria imaginação. Desta forma, cada leitor interpreta o texto de acordo com sua própria visão de mundo, visão que se forma na medida em que cada um se insere na cultura, no seu meio social. Se nos dispusérmos a escrever um livro de história, certamente estaremos enfeixando num volume a nossa percepção dos fatos. Entretanto, nosso objetivo atual não é divulgar nossa posição, mas colaborar para que outros tenham acesso às mesmas informações que recolhemos ao longo da nossa trajetória de pesquisas.

Convidamos o leitor interessado a visitar o endereço http://nuevomundo.revues.org/document1499.html onde se encontra um texto de Sandra Jatahy Pesavento denominado “Palavras para crer. Imaginários de sentido que falam do passado”. Nele a autora ressalta que “aquilo que se rememora e que se presentifica no discurso histórico e no discurso memorialístico pertence a um tempo físico já escoado e irreversível”. O que nós pretendemos, ao publicar extratos de documentos, é permitir que nossos leitores construam seus próprios discursos sobre este tempo escoado, reinterpretando os fatos através da imaginação assim despertada. Já se vai longe o tempo em que os estudantes viam a história como uma “disciplina chata”, cheia de datas e nomes que precisavam decorar para a prova. Não, não é esta a história que nos atrai. Antes, pelo contrário, queremos é um espaço de reflexão, uma fonte para despertar nosso imaginário e nos permitir reconstruir o mencionado tempo escoado. Em seguida, partindo dele, teremos descoberto um novo olhar sobre o presente que nos envolve.

Recreio, MG: O Direito ao Passado

A leitura de um artigo de Maria Célia Paoli, disponível em http://www.fae.ufmg.br/labepeh/PREFEITURA/memoriahistoria.pdf, suscitou uma série de reflexões sobre o que está sendo feito pela construção da cidadania em nossos espaços educativos, seja nas escolas ou nas demais instituições. Com o título “Memória, História e Cidadania: o direito ao passado”, logo no início a autora diz que,

“quando se fala em patrimônio histórico, pensa-se quase sempre em uma imagem congelada do passado. Um passado paralisado em museus cheios de objetos que ali estão para atestar que há uma herança coletiva - cuja função social parece suspeita. Monumentos arquitetônicos e obras de arte espalhadas pela cidade, cuja visibilidade se achata no meio da paisagem urbana, Documentos e material historiográfico que parecem interessar somente a exóticos pesquisadores.”

Por conta desta visão parcial, que não percebe o homem construindo e reconstruindo o espaço, muitas vezes nos sentimos meio deslocados quando sugerimos uma atividade de resgate cultural em nossas pequenas cidades. Quantas vezes recebemos, como resposta, um olhar de descrédito e palavras desestimulantes, geralmente repetindo velhas fórmulas sobre o desinteresse dos moradores?

Por isto as palavras de Paoli se revestem de um significado especial. Neste artigo ela ressalta que as posições antagônicas, como pensar que tudo deve ser conservado em contraposição aos que defendem a substituição pelo moderno, indica um modo de pensar a história de forma totalmente abstrata. Segundo a autora,

“Isto aponta claramente para uma sociedade destituída de cidadania, em seu sentido pleno, se por esta palavra entendermos a formação, informação e participação múltiplas na construção da cultura, da política, de um espaço e de um tempo coletivos.”

O que nós, os “exóticos pesquisadores” queremos, é manter abertas outras portas que permitam ao cidadão repensar sua posição no mundo, fazer escolhas, ser informado e participar da construção de seu próprio tempo.

Este nosso comentário objetiva manifestar a grande satisfação com a notícia de que o poder público de Recreio está empenhado em ampliar a agenda da Exposição Agro-Pecuária de 2007. Durante o evento, será realizada uma exposição fotográfica, com a curadoria de Pedro Dorigo, constando de imagens da cidade e de muitos dos personagens que construíram a história de Recreio.

Recreio, MG: Atos Públicos

A distância no tempo pode levar-nos a interrogações curiosas. Uma delas: onde eram realizadas as eleições, já que não havia prédio público em Recreio?

Em primeiro lugar cabe ressaltar que no século XIX as eleições eram realizadas, na maioria das vezes, na Igreja. A designação do local era feita pela Presidência da Província. Quando algum motivo impedisse o uso do espaço da Igreja, era então determinado um outro local. É o que podemos observar no seguinte trecho do Relatório da Presidência da Província de 13 de abril de 1886, página 21:

“Achando-se em obras a casa do cidadão Ignacio Ferreira Brito, anteriormente designada para n’ella celebrarem-se os actos eleitoraes da parochia da Conceição da Boa Vista, designei, a 28 de outubro, o predio do Exm. Barão de Avellar Resende para aquelle fim, tendo em vista a informação da camara municipal da Leopoldina, datada de 23 de setembro, e o art. 94 do decreto n. 8213 de 13 de agosto de 1881”

Aproveitamos para lembrar que o título de Barão de Avelar Rezende foi concedido a 9 de setembro de 1882 a Quirino de Avelar Monteiro de Rezende. Parece-nos que é o mesmo personagem conhecido por Quirino Ribeiro Monteiro de Rezende, cujo casamento havia sido celebrado na Matriz de Conceição da Boa Vista em 1862. A família deste titular do império estava radicada no distrito desde 1838, onde formou a Fazenda Saudade que passou a pertencer ao distrito de Santa Isabel (Abaíba), criado em 1890.


Leia também: Aspectos Históricos de Recreio, MG: Itapiruçu deixa de ser distrito de Leopoldina

Antigos Hotéis de Recreio, MG


No post publicado no dia 1º de janeiro, informamos que o Arraial Novo contava com dois locais de hospedagem, conforme se depreende da análise do livro do Cartório de Notas de Conceição da Boa Vista 1884-1885, folhas 124 a 127. Comentando tal informação, escreve Pedro Dorigo:
"Quando criança, lembro-me de dois hotéis, em Recreio: Hotel Pinho, de propriedade (ou arrendamento) de Sebastião (Zim) Teixeira de Castro [filho de José Teixeira de Castro e Francisca de Almeida]; Hotel Recreio, do Sr. José Moreira. Mas é claro que houve outros proprietários. Sei que o Hotel Recreio, talvez nas primeiras décadas de 1900, pertenceu ou foi arrendado por Serafim Coimbra e que o Hotel Pinho pertenceu à mesma família proprietária do Bazar Pinho [antigo Empório Tomasco], pais de Guilhermino Martins."

Aproveitamos este comentário para lembrar que, com o novo destino dado a uma parte da Fazenda Laranjeiras, foi necessário atender a demandas específicas do espaço urbano. Entre elas, locais de hospedagem e um comércio mais diversificado como o representado pelo Empório Tomasco, depois Bazar Pinho, abaixo em fotografias que farão parte de uma exposição programada para julho deste ano de 2007. Acrescentamos, para melhor esclarecimento dos leitores, que Guilhermino Martins era genro, e não filho dos proprietários do Hotel Pinho, conforme informou sua bisneta Mercês Martins Simão.

Esta fotografia foi tomada, provavelmente, na primeira década do século XX. A localização do prédio é a esquina diagonal oposta à do extinto casarão dos Melido.




Nesta outra imagem a casa comercial está com o nome Bazar Pinho. A data no alto do prédio, pouco abaixo do telhado, é 1912 ou 1914. Atualmente o prédio pertence a Arcelino de Oliveira Simão (genro de Guilhermino Martins, antigo proprietário, e filho de Américo Simão), cuja praça, em frente, leva o nome de seu pai.

Veja outros comentários sobre Serafim Teixeira da Luz:

Recreio, MG: Outro Negociante

Recreio, MG: Memória da Cidade na Internet

Recreio, MG: Triângulo


Ao serem publicadas as informações sobre os primeiros aforamentos, nosso parceiro Pedro Dorigo lembrou-se das versões que vem recolhendo entre os moradores mais antigos de Recreio. Segundo Astor Antonio Diehl, em seu livro Do Método Histórico, "o pensar histórico terá plausibilidade [...] se for baseado no princípio da fundamentação argumentativa" (p.23) É a este pensar histórico que nos propomos, ao avaliarmos os documentos do passado à luz de outras fontes. O mesmo Diehl nos ensina que um dos passos da metodologia da pesquisa histórica é a interpretação, momento em que são "analisadas as informações levantadas sobre as experiências do passado através da crítica das fontes" (2001, p. 25).
Esclarecendo um pouco mais a nossa base teórica, remontamos a Hebe Castro que, no artigo História Social publicado em Domínios da História (organização de Ciro Cardoso e Ronaldo Vainfas) lembra que "as vivências históricas individuais, passíveis de serem parcialmente reconstituídas, [constituem] um nível privilegiado de observação para rever e formular novos problemas à explicação histórica"(1997, p.53)
Assim é que transcrevemos o comentário de Pedro Dorigo, com o objetivo de abrir um novo olhar sobre informações de fonte oral que enriquecem a pesquisa que estamos realizando sobre a história de Recreio.
“Há muito venho ouvindo uma versão oral sobre a existência de uma Estação Recreio anterior à atual. Se houve, parece que se localizaria no "Triângulo". Presumo isso a partir das informações sobre a localização dos primeiros aforamentos. Veja aqueles cujos limites ao fundo se referem à Estrada de Ferro Alto-Muriaé. Se a Estrada de Ferro Alto-Muriaé e a Estrada de Ferro Leopoldina, desde as respectivas inaugurações, nunca mudaram os seus traçados originais, a única parte da cidade em queou havia uma rua com casas de frente para a Estrada Ferro Leopoldina e fundos para a Estrada de Ferro Alto-Muriaé é exatamente a região do "Triângulo", conforme demonstro no meu tosco desenho e numa combinação de fotografias aéreas atuais. Neste localainda muitas moradias bastante antigas e, pelo que conheço, é certamente um dos locais mais antigos da cidade, quiçá o mais antigo. É provável, neste caso, que a segunda estação tenha sido construida um pouco mais para trás, visando atender as duas linhas.”





Recreio, MG: Obras Públicas

Escreve-nos Alcindo Pereira, do Mato Grosso, contando que freqüentou a cidade de Recreio na adolescência, mais especificamente o distrito de Conceição da Boa Vista. Menciona a igreja católica local, cuja imponência encantava moradores e visitantes do lugar. Pergunta sobre a conservação do espaço público e relata que ouvia os moradores locais dizerem que o distrito fora abandonado quando os Ferreira Brito resolveram mudar a sede para mais perto de sua fazenda.

Não temos informações abrangentes para comentar o assunto. Entretanto, lembrando que nossos estudos são concentrados no século XIX, e portanto não abrangem a história recente de Recreio, podemos informar que continuaram sendo realizadas obras públicas no distrito de Conceição da Boa Vista nos primeiros anos do então Arraial Novo, depois distrito de Recreio. Nos livros de Atas da Câmara Municipal de Leopoldina observamos que houve algum cuidado em atender a população local, sempre que um requerimento de melhorias chegava àquela Casa.

Citamos, por exemplo, o pedido de obras no Largo de Santo Antônio encaminhado à Câmara Municipal de Leopoldina por Francisco Ferreira Brito. O serviço foi realizado pelo Alferes Manoel Maria de Gouvea, constando de um aterro no logradouro. Pela obra a Câmara Municipal de Leopoldina pagou a quantia de 1 conto e 500 mil réis, havendo menção à liquidação no livro do Cartório de Notas de Conceição da Boa Vista de 1883-84, folhas 123 e verso, com data de 3 de julho de 1884.

Inauguração das Estações da Leopoldina na região de Recreio, MG

Alguns estudiosos das ferrovias brasileiras costumam alertar sobre a impossibilidade de determinar a data correta em que muitas estações começaram a operar. Tal ocorre porque, em diversos casos, a inauguração festiva ocorreu algum tempo depois do início das operações, em função de adequação da agenda da autoridade convidada para o evento. Em outros casos, outros foram os óbices. A estrada ficou pronta, a estação devidamente aparatada para receber cargas e passageiros mas as composições só chegaram muito tempo depois. Algumas vezes a inauguração oficial pode ter ocorrido mesmo assim, sendo a linha utilizada apenas no dia da festa, com a comitiva transportada por um vagão especial que jamais tornaria a passar por ali. Enfim, são muitas as possibilidades e não caberia, neste espaço, discuti-las.

Nosso interesse, ao buscarmos as datas, é apenas fixar o período aproximado em que a paisagem de determinado local passou a sofrer as alterações advindas do novo meio de transporte. Muito embora nem todos os autores concordem, há os que afirmam que a abertura da Estrada de Ferro da Leopoldina objetivava prioritariamente o transporte de cargas e só posteriormente foi planejada a circulação das composições mistas, de cargas e passageiros. De toda maneira, mesmo quando eventuais viajantes se aboletavam no meio dos produtos agrícolas para dirigirem-se a outra localidade, o transporte ferroviário já houvera modificado profundamente o modo de vida local.

Comparando as informações obtidas nos Relatórios da Presidência da Província de Minas Gerais e no Almanak Laemmert com os dados das Efemérides Mineiras de José Pedro Xavier da Veiga, temos o calendário a seguir.

8 de outubro de 1874 – inauguradas as estações Porto Novo (Além Paraíba), Pântano (depois Antônio Carlos, atual Fernando Lobo) e Volta Grande. A estação de São José, localizada entre a Porto Novo e a Pântano, só foi construída mais tarde, com o objetivo de desafogar a estação Porto Novo que era o ponto de ligação da Estrada de Ferro Pedro II com a Leopoldina.

10 de dezembro de 1874, inauguradas as estações São Luiz (Trimonte) e Providência.

1875 – início das operações na estação São Martinho e conclusão do assentamento dos trilhos até Santa Isabel (Abaíba)

25 de maio de 1876 – inaugurada a estação Santa Isabel (Abaíba)

entre junho e agosto de 1876 – inauguradas as estações Recreio e Campo Limpo (Ribeiro Junqueira)

02 de julho de 1877 – inauguradas as estações Vista Alegre e Leopoldina.

Dezembro de 1877 – inaugurada a estação Santa Rita (Cataguases). A estação de Aracati, localizada entre Vista Alegre e Cataguases, só foi construída mais tarde, tendo sido inaugurada a 21 de setembro de 1885.

O outro ramal registra as seguintes datas de inauguração, relativas a localidades com as quais a população do Arraial Novo (Recreio) mantinha mais freqüentes contatos:

  • 26 de abril de 1883 – estação São Joaquim (Angaturama)
  • 11 de maio de 1883 – estação Tapirussu (depois Aliança, atual Cisneiros)
  • 09 de junho de 1883 – estação Palma
  • 04 de dezembro de 1884 – estação Banco Verde 23 de março de 1885 – estação Morro Alto