Citações e Transcrições

Agradecemos também aos visitantes que estranharam vocabulário e ortografia em alguns posts. Apesar de termos usado a formatação das fontes em itálico para destacar as citações, parece não ter ficado claro que os documentos de origem foram redigidos sob antigas normas da língua padrão.

Pedimos a compreensão de nossos leitores. Optamos por respeitar a forma nas transcrições e procuraremos fazer comentários sempre que um trecho parecer incompreensível.

Recreio, MG: Boqueirão dos Bagres

Três visitantes deste blog comentaram o post de 20 de dezembro, sob o título O Arraial Novo e a Estação. Todos apoiam-se em literatura onde o nome aparece como Boqueirão dos Bugres e não dos Bagres o ponto onde a ferrovia seria bifurcada.

Ao tempo em que agradecemos as visitas, lembramos que no Relatório da Presidência da Província de Minas Gerais, do ano de 1876, página 36, o nome é Boqueirão dos Bagres mesmo. Além disso, nos Registros de Terras de 18 de fevereiro de 1856, algumas propriedades são identificadas pela vizinhança com o Ribeirão dos Bagres. Portanto, fica reiterado o nome conforme constou no texto de 20 de dezembro.

Certidão de Nascimento de Recreio, MG: o aforamento das terras do Arraial Novo

A Fazenda das Laranjeiras – ou parte dela, estava hipotecada ao Banco do Brasil. Era o ano de 1885 e os proprietários requereram autorização para alienar a área próxima à Estação do Recreio. Assim, os registros encontrados no Livro do Cartório de Notas de Conceição da Boa Vista constituem-se numa espécie de Certidão de Nascimento da futura cidade de Recreio. Nas folhas 127 e verso do livro relativo aos anos de 1884 e 1885, encontra-se o seguinte:

Registro de uma autorisação do Banco do Brasil do theor seguinte: = nº 1672 – O Banco do Brasil, representado pelo seo Presidente, abaixo assignado, e na qualidade de credor hypothecario do Capitão Ignacio Ferreira Brito e sua mulher, lavradores no Municipio da Leopoldina, concede a preciza autorisação pra que possão aquelles devedores alienar o dominio util de cerca de dois hectares do terreno da fazenda das Larangeiras, terreno que fica junto à Estação do Recreio, por meio de contractos de aforamento, devendo o Banco ser informado dos nomes dos foreiros, quantidade de terreno aforado e preço do aforamento; continuando a garantia hypothecaria sobre o dominio directo da parte do terreno alienado. Rio de Janeiro doze de Março de mil oito centos e oitenta e cinco. J. Machado Coêlho de Castro. Estava uma estampilha de duzentos reis, devidamente inutilisada pela data e assignatura. Nada mais se via estar em o dito papel de autorisação, que fielmente copiei do proprio original a que me resporto, dou fé, e assigno em sete de Abril de mil oito centos e oitenta e cinco. O Escrivão, Carlos Rebollido Pinheiro.

Mudanças no traçado da Estrada de Ferro da Leopoldina

Pelo estudo realizado, observamos que os planos para a construção da Estrada de Ferro da Leopoldina foram modificados algumas vezes, com revisão do traçado inicialmente previsto. Os relatórios da presidência da Província deixam claro que o objetivo primordial da ferrovia era atender ao escoamento da produção agrícola, não se prendendo à localização das cidades. Como exemplo, citamos a seguinte fala: “o terreno é todo accidentado e improdutivo, oferecendo uma construcção para a estrada de grandes dificuldades e despezas”. Prosseguindo, a autoridade argumenta que a estrada deve favorecer diretamente as florescentes lavouras e que os poderes públicos não devem menosprezar as dificuldades e gastos exorbitantes, de modo a tornar “reaes os seos beneficios e reconhecidas vantagens, para que não esmoreça o espirito de iniciativa, que mal disperta na provincia”. Ou seja: ao apresentar projeto de alteração, que precisava de aprovação da Assembléia Legislativa, o orador chama a atenção para a necessidade de evitar onerar a empresa construtora.

Acreditamos que tais argumentos possam ser contestados pela vertente dos interesses políticos que cercaram a obra. De todo modo, percebe-se que a mudança de um percurso, como foi o caso entre Conceição da Boa Vista para o Arraial Novo, levou também em consideração as dificuldades do trajeto inicialmente previsto.

Esta argumentação se repete quando, em 1875, é analisada outra mudança que levaria os trilhos para Vista Alegre. Diz o relatório que a modificação, importando um afastamento de cerca de 6km da cidade da Leopoldina, em nada prejudica a zona que tinha de ser precorrida e procura o natural prolongamento da estrada. E diz mais: “cumpre attender que este facto traz lucros à lavoura, à empreza e aos cofres publicos, e não estamos ainda em circumstancias de fazer estradas de ferro que prefirão o commercio das cidades aos interesses da lavoura; porquanto esta é quase que a nossa unica fonte de rendas, e não temos e nem poderemos ter tão cedo cidades que por sua industria possão, não digo sustentar por si caminhos de ferro, mas obrigar estes a deixar em seo proveito, aliás incerto e fallivel, os productos conhecidos de uma agricultura já feita e que se augmentrá infallivelmente com as facilidades de transporte e de consumo”.

A estrada de ferro Alto-Muriaé

Outro fator a acelerar a urbanização do então Arraial Novo foi a estrada de Ferro Alto-Muriaé. Segundo o relatório da Presidência da Província de Minas Gerais, de 4 de maio de 1881 o presidente da Companhia Estrada de Ferro Alto Muriaé, Dr. Custódio José da Costa Cruz, informou que no dia 5 de janeiro daquele ano a Companhia foi instalada, com o fim de executar o contrato assinado com a Província em 11 de agosto de 1879. Trata-se do contrato para construção de uma linha férrea entre a Estação do Recreio e o povoado de São Francisco do Glória.

Observa-se que decorreram dois anos entre a assinatura do contrato de concessão e a organização da companhia construtora. A partir de então, e segundo o mesmo documento, entre janeiro e abril de 1881 foram “explorados e estudados 6 (seis) quilômetros da nova estrada, entre a Estação do Recreio e o Capivara”. Parece claro que construção da estrada só teria sido iniciada posteriormente, já que no relatório seguinte, de 12 de dezembro de 1881, o presidente da Província informa que aprovou os estudos sobre os primeiros 29 quilômetros da ferrovia Alto-Muriaé.

Confirmando tais informações, o relatório da Presidência da Província, de 1 de agosto de 1882, informa que naquele ano foram iniciados os trabalhos de construção dos 29 quilômetros da estrada, a partir da Estação do Recreio. Acrescente-se que somente em 1885, por ocasião da urbanização das terras da Fazenda Laranjeiras no Arraial Novo, surgem referências sobre esta ferrovia nos livros cartoriais de Conceição da Boa Vista.

O Arraial Novo e a Estação

Consultando os livros do Cartório de Notas de Conceição da Boa Vista relativos ao período 1869 a 1885, constatamos que a partir de 1877 começam as referências ao “Arrayal Novo que se está fundando neste Distrito”. Procurando as origens deste povoado, fizemos algumas buscas em documentos relativos à Estrada de Ferro Leopoldina, que seria a origem da atual cidade de Recreio.

A autorização para construir a estrada de ferro ligando Porto Novo do Cunha a Leopoldina veio com a Lei Mineira nº 1826, de 10 de outubro de 1871. Três anos depois, em outubro de 1874, foram inauguradas as estações de Porto Novo e Volta Grandre. Mais um ano e meio e, em dezembro de 1874, inaugurava-se a estação de Providência, de onde partiriam os trilhos para atingir Conceição da Boa Vista. Em agosto de 1876 foi inaugurada a estação de Campo Limpo, atual Ribeiro Junqueira. Sendo assim, os trilhos teriam cruzado o território do atual município de Recreio entre 1874 e 1876 e não parece viável que a Estação do Recreio tenha começado a operar em julho de 1874, como informa o site da Prefeitura Municipal de Recreio.

Para avalizar nossa opinião, além dos registros de transmissão de propriedade consultamos os relatórios da presidência da Província de Minas Gerais. Assim é que soubemos que no ano de 1875 foram concluídos os 59 km que ligavam Porto Novo do Cunha a Santa Isabel, hoje Abaíba.
Pelo contrato de 3 de maio de 1875, ficou estabelecido, em seu artigo 1º, que “do ponto onde estão concluidos os trabalhos de construcção irá até ao Boqueirão dos Bagres, e d’hai, bifurcando-se, se estenderá, por um lado, até a Cidade da Leopoldina, e por outro até a Villa Cataguazes, antigo arraial de Santa Rita do Meia Pataca”. Entendemos, portanto, que os trilhos foram assentados na região de Recreio entre maio de 1875 e agosto de 1876.

O nome da Estação do Recreio

É também de fonte oral a informação de que Inácio Ferreira Brito não gostava que dissessem que ele era proprietário da Fazenda das Laranjeiras, sempre alegando que esta era propriedade de seu irmão Francisco. Contam que, na tentativa de fixar o nome de sua propriedade – a Fazenda do Recreio, Inácio pediu que a Estação do ramal ferroviário recebesse o nome de Estação do Recreio.Pelo que pudemos apurar nos livros do Cartório de Notas de Conceição da Boa Vista, as duas propriedades – Laranjeiras e Recreio, eram vizinhas. Mas todas as referências à ferrovia, constantes nos livros do cartório, indicam que “deviza com terras da Fazenda das Larangeiras, de propriedade de Ignacio Ferreira Brito e sua mulher, Mariana Ozória de Almeida”

O surgimento do Arraial Novo, Recreio, Minas Gerais

É conhecida a versão sobre a criação do Arraial do Recreio a partir da negativa dos proprietários da Fazenda de São Mateus, impedindo que os trilhos do ramal ferroviário chegassem a Conceição da Boa Vista, o antigo Curato que foi elevado a Distrito de Paz pela Lei 533 de 10 de Outubro de 1851. Para solucionar o impasse, os irmãos Inácio e Francisco Ferreira Brito, proprietários da Fazenda das Laranjeiras, ofereceram suas terras para a passagem da ferrovia.